quinta-feira, 23 de maio de 2013

História para se ouvir no colo do avô

O PASTOR
história familiar recontada

      Chamava-se Joaquim e era pastor de ovelhas, como a maioria dos meninos de sua idade, naquele tempo e naquele lugar.
      Ele não pastoreava suas próprias ovelhas, pois nem as tinha, mas as de uma velha senhora que morava a uma légua de sua casa.
      Como, é claro, ia a pé para o trabalho, e como pastores começam a trabalhar muito cedo, ele tinha de sair de casa com o céu ainda escuro, antes de o sol nascer.
      Hoje parece estranho pensar nisso, mas não havia relógio naquela casa de pastores pobres do interior de Portugal, no fim do século 19. Você há de perguntar: e como é que ele fazia para não perder a hora? Ora, dormia muito cedo, e depois de 8 horas de bom sono, acordava naturalmente. Além disso, sempre havia o galo para ajudar, com seu aviso ruidoso de que o dia estava para nascer.
      Aconteceu que, um dia, o galo cantou na hora errada, bem mais cedo do que de costume. E, já que não tinha relógio, Joaquim só percebeu o engano ao chegar à entrada do bosque que ficava próximo à fazenda onde ele trabalhava.
      Normalmente o sol já estava nascendo quando chegava ali, e assim ele não precisava atravessar o bosque no escuro.
      Mas nesse dia, como havia acordado cedo demais, quando ele chegou ao bosque o céu ainda estava negro, e a lua alta. Seria perigoso continuar, pois havia lobos por ali, e ele decidiu esperar pelo amanhecer.
      Deitou-se à beira da estrada, e voltou a dormir. Ou quase. Na verdade, ainda não estava completamente adormecido quando sentiu que um animal o farejava. Seu sangue gelou.
      Era um lobo, ele sabia. Felizmente aquele animal estava sozinho, e lobos só atacam quando estão em bando. Então, Joaquim prendeu a respiração e fingiu-se de morto, rezando para que o bicho fosse logo chamar seus companheiros da alcatéia. E, realmente, ele foi.
      Com as pernas moles e o coração na boca, o pastorzinho subiu, o mais rápido e o mais alto que pode, na primeira árvore que encontrou. Quando os lobos voltaram - e dessa vez eram muitos - ele já estava seguro.
      Os lobos cheiraram o lugar onde o menino estivera deitado, seguiram o cheiro até o pé da árvore onde ele subira e ficaram ali, uivando, por muitos milênios. Pelo menos foi esse o tempo que ele pensou ter ficado tremendo lá em cima daquela árvore.

      Quando o sol finalmente raiou, os lobos se foram e Joaquim pode descer da árvore e correr para casa. Naquele dia não pastoreou, nem nunca mais. Veio embora para o Brasil. Mas essa é outra história.

SABOR DE HISTÓRIA

CUSCUZ       


     Havendo nascido e crescido no Vale do Paraíba, o primeiro cuscuz que conheci foi, obviamente, o paulista, feito com sardinha, camarão, tomate, ovos cozido e outras coisinhas que a criatividade peça.


            Vinte e tantos anos depois vim a conhecer o cuscuz baiano, que segue a máxima japonesa segundo a qual a simplicidade é o superlativo do requinte:


            Mais recentemente fui apresentada, quase concomitantemente, ao cuscuz da Paraíba


e ao primeiro e original: o couscous marroquino, feito de sêmola de trigo, e não com farinha de milho, como os brasileiros.



Ao decidir escrever a respeito desse prato delicioso e de tantas facetas senti que deveria fazer alguma pesquisa. Sabem o quê descobri? Que as versões do Nordeste provavelmente derivaram da receita original, aquela que os portugueses aprenderam com os mouros e depois trouxeram para o Brasil, mas a versão paulista teria origem totalmente diferente! Segundo li, como os tropeiros transportavam juntos, no mesmo farnel, a carne, os legumes e a farinha de milho, durante a viagem tudo se misturava, a farinha absorvia a umidade dos outros ingredientes e – TCHAN-RAN! aquilo tudo virava um bolo!

Confiram:
http://cozinhaeliteratura.blogspot.com.br/2011/05/cuscuz-paulista.html.